Há dias, dias sem tréguas, em que as palavras me fogem desenfreadamente, como que desavindas por qualquer motivo que não consigo almejar. Grito por elas, em surdina, porque sei que não me podem ouvir e eu não quereria assustá-las. Tento apanhá-las desprevenidas, prendê-las na rede que vou lançando em bólus de energia e esperança, ao menor indício da sua passagem. Mas as minhas esperanças esmorecem ao cair da excitação que acompanha a vinda da rede sem elas. Deixo cair os braços, desfalecida, deixo a rede cair no chão. Já vi que de nada serve, com buracos grandes demais, ou palavras demasiado curtas as que andam no ar. Ou talvez a conspiração em que se meteram contra mim seja mais séria do que imaginava.
Cruzo os braços, numa atitude não de desistência, mas de impotência temporária, à espera de dias melhores, preenchidos de palavras.
E, no entanto, continuo a ouvi-las, cada vez mais. Ao longe, quase em sussurro, sopradas, maravilhosas, com toda a sensualidade inerente às coisas inalcançáveis. Cortam-me o coração de tão belas, tão límpidas, tão certeiras nas asserções que fazem quando se juntam todas, enfileiradas, parecendo conhecer-me de há longa data. E, no entanto, não lhes pego, não lhes consigo tocar, não lhes consigo fazer ver quão próximas somos, eu e elas, e como, por isso mesmo, me poderiam deixar pegar-lhes por uns instantes.
Resta-me assim continuar a ouvi-las, ainda que em surdina, no murmúrio do vento, nas bátegas de água a cair nestes dias de Abril, no calor dos raios de sol que rasgam, a intervalos, o manto nublado do céu.
E sonhar que um dia algumas delas se tornarão tangíveis, me deixarão pegar-lhes e delas fazer o que quiser.
Vega, aka C.V.O.