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Tenho saudades dos Natais de antigamente. Da ansiedade com que esperava, ano após ano, a chegada de um velhinho barbudo que entraria pela chaminé e cobriria o chão de presentes. A angústia que me assaltava, ano após ano, quando, ao regressar da rua, aonde fora por escassos minutos com a minha mãe despejar o lixo, me abriam a porta anunciando que o Pai Natal acabara de sair. Mais uma vez o deixara escapar... Eu que tinha prometido a mim mesma, aquele Natal, não afastar os olhinhos do buraco da fechadura, de onde teria que ver o velhote a descer pela chaminé e a descarregar os presentes da sacola. Se o truque resultava com a minha prima, porque é que comigo falhava sempre?! Ela era seis anos mais velha que eu, por isso, deveria ter visto o Pai Natal por tantas vezes quantas os meus anos e mais seis ainda em cima... Tantas, que eu nem podia imaginar! Eu, nem uma... Parecia que tinha de haver qualquer coisa que me fazia não estar presente no exacto momento em que ele aparecia! Mas nunca se esquecia de mim, e só isso, o alívio que sentia ao saber que, mais uma vez, ele deixara brinquedos na minha árvore, bastava para dissolver a angústia de não o ter visto.
Lembro-me da euforia que era abrir os presentes com o meu primo, jorravam papéis e laços para o ar, rodopiavam papéis e laços pelo chão, ora pulos, ora gritos, ora corridas pela casa, que palpitava de alegria e rejubilava com tamanha azáfama.
O encanto que o pisca pisca da árvore de Natal exercia sobre mim, atraindo como um íman os meus olhinhos curiosos. O quanto eu gostava de ali ficar, esquecida das minhas obrigações que não existiam, com as pupilas cravadas no piscar das luzes que por elas entrava como pérolas mágicas.
O cheirinho dos sonhos que a minha avó fazia, com o sabor que apenas têm as coisas impregnadas do carinho de quem as fez. Os sonhos que me consolavam quando, na manhã seguinte, pensava que teria de esperar um ano para ter outra noite de Natal.
As festas que havia na escola, o rebuliço dos ensaios, da construção dos cenários, de ter tudo preparado para o grande dia. E, finalmente, o nervosismo de subir ao palco, e o orgulho de declamar um poema que conseguira decorar.
Lembro e relembro, nesta altura do ano, os Natais de antigamente. E, por momentos, desejo voltar a ser criança. Para que o tempo me devolva os familiares que já não tenho, o sabor dos sonhos que nunca mais provei, o fascínio das luzes a piscar, a esperança de ver o Pai Natal desta vez, as festas na escola que já fechou. Mas o tempo não me concede o desejo, e eu agradeço-lhe, porque só assim os Natais de outrora são recordados com a doçura das coisas perdidas para sempre.
Vega, aka C.V.O.
Eu, a recitar um poema numa festa de Natal da escola (Dez.86 - 5 aninhos)